A demência não tira férias, o que fazer?

Catarina de Oliveira, Psicomotricista em ERPI (Estrutura Residencial para Pessoas Idosas) e ao domicílio

Agosto é sinónimo de férias e férias é sinónimo de descanso. A demência não tira férias, mas os cuidadores (devem) sim! Que estratégias podem cuidadores informais utilizar com os seus familiares com demência no período das férias?

Trabalhar com pessoas com demência é um desafio diário, mas viver com uma pessoa idosa com demência é ainda mais exigente e, segundo os estudos científicos, acarreta grandes níveis de stress e ansiedade para os cuidadores informais. A demência não tira férias, mas os cuidadores devem e têm o direito de poder descansar não só dos seus encargos profissionais, mas também do seu papel adicional: o de cuidadores.

Para uns, há a possibilidade de integrar os seus familiares com demência em instituições e serviços de apoio na comunidade para descanso do cuidador. Mas para outros, isso não é uma possibilidade. Sendo assim, que estratégias podem ser utilizadas pelos cuidadores informais, para integrarem as pessoas com demência no período das férias?

Deixo aqui 10 dicas simples e práticas que reuni da literatura para os cuidadores:

  1. Preparar a pessoa com demência para o período das férias.

É importante antecipar um período em que as rotinas mudam um pouco daquilo que é o quotidiano. Se as férias forem para outro sítio, diferente do local de residência, aproveite para mostrar fotografias do local, nomes de sítios que pretendem visitar e preparar a pessoa tanto quanto possível para essa mudança. Pode aproveitar para estimular a memória da pessoa idosa e pedir que mencione nomes de países (no caso de ir para fora) ou nomes de cidades.

  1. Fazer as malas e… estimulação cognitiva. Como?

Se é mais fácil e rápido ser o cuidador a preparar a mala? Sim! Mas aproveite este momento para poder passar mais tempo com o seu familiar e estimulá-lo com situações reais e do seu quotidiano. Na altura de preparar as malas, peça a colaboração da pessoa idosa. Pode fazer uma lista com ela e, ponto por ponto, ir confirmar que estão a levar tudo. Além disso, pode ainda pedir à pessoa que vá nomeando os diferentes objetos/vestuário. Na altura de colocar as coisas dentro da mala, pode ir dando várias pistas e a pessoa ter que arrumar “Sr. Pereira, no fundocoloque o vestuário, depois o calçado” (como por exemplo).

  1. Vestuário e calçado simples e adaptado ao local.

Assegure-se que a pessoa idosa usa roupa confortável, leve e adaptada a vários ambientes. O calçado deve ser confortável e adequado para evitar ou diminuir o risco de quedas.

  1. Identificação e contactos mais importantes.

Já no local, assegure que o seu familiar possa ser facilmente identificado: facultar à pessoa idosa uma cópia do seu documento de identificação; algum documento com informações clínicas mais importantes e relevantes sobre o seu diagnóstico, em caso de desorientação; informações breves sobre o local onde está, para o caso de se perder; o contacto de algum familiar mais próximo, em casos de desorientação e pode ainda recorrer ao uso da pulseira “Estou aqui”, numa esquadra de Polícia de Segurança Pública.

  1. Assegurar que o local escolhido, pode ser adaptado a pessoas com demência.

Assegureantempadamente que o local escolhido é seguro e que pode ser adaptado às necessidades da pessoa idosa: WC adaptados; remover objetos que possam potenciar o risco de queda (como por exemplo, tapetes); evitar ter chaves nas fechaduras, para evitar que a pessoa idosa possa ficar trancada. Se possível, levar algum objeto familiar e do interesse da pessoa idosa para esse local, para promover maior integração e segurança, tornando o ambiente mais familiar. Durante a noite, assegure a acessibilidade ao WC em segurança, com uma boa iluminação e ter atenção a portas e saídas de emergência, de modo a evitar que a pessoa possa sair sem alguém dar conta.

  1. Orientar a pessoa no tempo e espaço, diariamente!

Procure orientar a pessoa idosa todos os dias, no tempo e no espaço. Pode utilizar um pequeno calendário e todos os dias, ter o hábito de assinalar, com a pessoa idosa, o dia em que se encontram. Outra estratégia é, no caso da pessoa idosa ainda conseguir ler, comprar o jornal diário e/ou livros de passatempos, adequando o seu grau de dificuldade ao estado de demência do seu familiar (como por exemplo sopas de letras, palavras cruzadas ou sudoku).

  1. Estabelecer e manter rotina.

Embora no período de férias, as rotinas possam ser, de um modo geral, alteradas, nas pessoas idosas e com demência, é importante manter rotinas, uma vez que irão potenciar a sua organização e orientação. Rotinas como o horário de acordar e deitar, refeições e higiene pessoal devem ser mantidas nos horários habituais da pessoa idosa.

  1. Não esquecer as necessidades básicas!

Assegurar que as necessidades básicas como a alimentação e higiene possam ser prestadas: no caso de a alimentação ter que ser adaptada, assegurar que os locais por onde estará conseguem satisfazer essas necessidades; no que diz respeito à hidratação, é fundamental ir hidratando a pessoa idosa ao longo do dia, mesmo que haja alguma recusa ou dificuldade na sua ingestão. Como alternativas, opte por chás frescos, águas aromatizadas, sopas ou o consumo de frutas ricas em água. No que diz respeito à medicação, a mesma deve ser tomada, respeitando os horários da mesma.

  1. .. mas ser realista com as expectativas!

Fazer planos do que se pretende realizar no período das férias é uma excelente ideia para aproveitar o tempo da melhor forma. No entanto, é necessário perceber que os planos podem não conseguir ser executados da mesma forma que se imaginou. Podem surgir alterações comportamentais da pessoa com demência, que impossibilitem que os planos sejam alcançados. Nesse caso, mantenha a calma e adote uma postura de aceitação, com um tom de voz calmo e tranquilizante para a pessoa idosa, tentando adaptar os planos.

  1. Não esquecer: aproveitar o tempo em família e descansar (sempre que possível)!

O tempo de férias deve ser um tempo de descanso físico e mental, por isso, realize atividades de lazer em família que possam ser adaptadas para as pessoas idosas (como por exemplo cartas, dominó ou até caminhadas). Se viajar com outros familiares, peça ajuda e divida tarefas, aproveitando esses momentos em que está sozinha para descansar e aproveitar para realizar atividades do seu interesse.

Espero que tenha sido útil.

No próximo mês, falo-vos de outro tema. Porque mais informação é mais saúde.

 

Catarina de Oliveira

Psicomotricista em ERPI (Estrutura Residencial para Pessoas Idosas) e ao domicílio